Batiam as nove badaladas no relógio da torre da
câmara e já todos os participantes no passeio cultural, promovido
pelo Grupo de Amigos de Castelo de Vide faziam um círculo entre a
Casa do Morgado e a oficina museu Mestre Carolino Tapadejo.
A presidente da Direção do Grupo de Amigos,
Maria do Carmo Alexandre, fez breves considerações sobre aquela
associação, o programa daquela noite e a apresentou-nos os guias
Nelson Almeida, arqueólogo de formação e Acácio Lobo, agrónomo
de formação e astrónomo por paixão, à apresentação deste
último todos demos uns passos para a frente ou para trás para
melhor perscrutar o céu, mas nada, um, arreliador e uniforme, manto
de nuvens altas não deixava ver uma estrela que fosse.
Logo ali o Acácio confirmou o que todos
suspeitávamos, com aquelas condições atmosféricas não era
possível qualquer observação astronómica. O grupo pôs-se em
marcha subindo o que faltava da rua Nova para chegar à Carreira de
Cima. Primeira paragem, frente ao “lajedo” o nosso arqueólogo
falou-nos dos muitos habitantes de Castelo de Vide que no século
XVIII em poucos dias ali foram sepultados por terem falecido com
peste, infetados que foram por soldados de um exército de
castelhanos e franceses que por aqui passou durante uma invasão a
Portugal.
Prosseguimos pela rua principal afora, entramos no
jardim grande, segunda paragem com o convento de São Francisco já
ali em frente. O Nelson fala-nos, agora, das muralhas que cercavam a
vila e de uma porta que ali perto existiu. Subimos pelo Calvário,
sempre com a cintura muralhada à vista até que chegámos ao Largo
de São Roque, aqui, virados para noroeste seguimos, com o olhar, a
linha reta formada pela corredoura, que nos vai conduzir ao
hegemónico torreão do castelo que, à noite, iluminado, ganha um
aspeto mais majestoso.
O nosso “restaurador da história” fala-nos do
Forte de São Roque. Como a minha infância tivesse passado por ali,
testemunhei o encanto daquela singela festa do São Mamede que
anualmente ali se fazia, em que bebíamos leite de cabra,
recém-ordenhado dum rebanho que o cabreiro dum lavrador ali conduzia
no dia da festa. De como aquele terreiro se transformava na
“monumental de São Roque” onde residentes da vila e de
localidades próximas mostravam as suas habilidades tauromáquicas e,
não raras vezes, eram brindados pelas vacas e garraios com uma
dolorosa sopa de corno. E aquelas “futeboladas” em que, ainda bem
não, e involuntariamente, um avançado fazia um chapéu, não ao
guarda-redes, mas ao muro do quintal da senhora Alexandrina. Esta,
atenta guardiã da sua horta rapidamente repunha em jogo, já não a
bola de borracha, mas as duas calotes esféricas que resultaram da
perícia e fúria com que a golpeava. Desta maneira foram
interrompidas algumas partidas sem direito a protesto, mas com alguns
impropérios dirigidos, por parte dos jogadores, à senhora
Alexandrina.
Franqueamos, então, a porta do forte passando de
fronte da capela de São Roque e juntámo-nos perto do depósito da
água, que outrora, fazia o abastecimento público a Castelo de Vide.
Era naquele preciso local que estava previsto colocar o
telescópio para fazermos, sob orientação do astrónomo as nossas
observações, mas fosse Urano ou fosse lá quem fosse, correu, nessa
noite, as persianas do quinhão de abóboda celeste que por cá nos
cabe, para só as voltar a abrir no dia seguinte. O nosso assistente
de astronomia ainda nos apontou a direção onde haveríamos de
observar algumas constelações e mais nada pôde fazer. Sempre direi
ao “nosso Galileu” adaptando um velho aforismo, sim, porque tudo
se pode adaptar, que “há mais astros que astrónomos” e bem
vistas as coisas, já faltará menos de um ano para a próxima edição
do Astrovide.
Por fim o piquenique de iguarias locais: empadas,
boleima, broas de mel, tudo do bom e do melhor. Como a noite estava a
ficar fresca, digo mesmo fria, uma reconfortante “ginjinha”
cuidadosamente acondicionada numa bonita e antiga garrafa do tempo de
uma das avós do casal Candeias, Maria da Conceição e João
Filomeno. Ainda uma autoapresentação dos participantes e finalmente
o brinde da praxe a todos os presentes.
Castelo de Vide, a poucos dias do começo do
Outono de 2015
João Calha
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