“Estamos no mês de Maio – e convém falar de rosas”. Assim começa este delicioso e pequeno texto de Eça de Queirós (1845-1900). “As Rosas” foi originalmente publicado, em 1893, no jornal brasileiro Gazeta de Notícias, do Rio de Janeiro, e teve primeira edição pela Dom Quixote em 1995. Nele o autor discorre sobre a evolução da flor ao longo dos tempos, as suas características, o seu uso na vida quotidiana, nas festas e nos rituais e a sua apropriação simbólica pelas religiões e pelos poderes.
“E flor profundamente interesseira e astuta! Já no dia primeiro de Maio, que se vai tornando o grande festival do proletariado, eu vejo a rosa quieta e contente nas calosas mãos dos operários em folga. Nos jardinetes dos mineiros, em Inglaterra e em França, já floresce sempre, entre as saladas democráticas, um pé de roseira viçoso e prometedor. Em todos os “meetings”, nas greves, é usual que a rosa venha armando a casaca dos chefes, ou apareça, bordada e já com a autoridade de um emblema, nas bandeiras das associações… E estou antevendo que esta hábil e intrigante flor, que foi sucessivamente helénica, pagã, imperial, feudal, católica, mística; que captando-lhes o amor, partilhou o poder dos heróis, dos senadores, dos césares, dos barões, dos papas, dos santos; que se identificou arteiramente com Vénus, quando era Vénus que no seu cinto fechava o mundo todo, e se identificou logo com a Virgem Maria, quando por seu turno foi a Virgem que pousou os pés sobre o orbe – anda a realizar a sua lenta conversão, e pouco a pouco se insinua e se entrelaça no novo e tremendo poder que se levanta, e toda ela se prepara, e se avermelha para ser, oficialmente e ritualmente, a flor do socialismo”.
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